A Defensoria Pública da
União (DPU) defendeu no Congresso Nacional, mulheres vítimas de violência
doméstica acusadas de subtração internacional. Em duas audiências públicas,
realizadas no Senado Federal e na Câmara dos Deputados, a defensora pública
federal Daniela Brauner falou sobre a aplicação da Convenção de Haia sobre os
aspectos civis do sequestro internacional de crianças em casos em que mães
brasileiras retornam ao país com seus filhos após sofrerem violência doméstica
No Senado, Brauner
destacou que é urgente considerar que essas mulheres são vítimas, e não
sequestradoras. Isso porque, a Convenção de Haia considera que a subtração
internacional de crianças acontece quando um dos genitores tira o menor do seu
país de residência habitual sem autorização do outro genitor ou de pessoa que
seja codetentora do direito de guarda.
No entanto a Convenção,
firmada em 1980, não leva em conta casos em que as mães retornam ao seu país de
origem por sofrerem violência doméstica dos genitores de seus filhos. Para a
defensora, é necessária a criação de medidas de salvaguarda para que os termos
do dispositivo afastem a possibilidade de separação permanente da criança com a
mãe, comumente a principal cuidadora da criança.
“Não há como decidir a
respeito do melhor interesse da criança sem considerar os laços envolvidos na
relação mãe e filho ou filha. Qualquer decisão que possa implicar o afastamento
definitivo ou duradouro do convívio entre mãe e filho ou filha acaba por
infringir o princípio da prioridade e melhor interesse da criança”, disse,
complementando. “Assim, nem sempre o retorno imediato representa o sucesso na
aplicação da Convenção de Haia, pois pode desconsiderar aspectos relevantes do
desenvolvimento da criança”.
Mães de Haia
Na Comissão de Defesa dos
Direitos da Mulher, da Câmara dos Deputados, a defensora pública federal
Daniela Brauner voltou a defender uma interpretação mais adequada à realidade
brasileira nos casos em que filhos são retirados de suas mães, mesmo após a comprovação
de que ela saiu do país do genitor após sofrer violência doméstica. “Precisamos
levar essa interpretação, que é uma interpretação brasileira, para os fóruns
internacionais de discussão da Convenção de Haia. Especialmente o entendimento
de que aplicar a convenção também é aplicar no artigo nº 13 o não retorno das
crianças em algumas situações”, explicou.
A audiência contou,
também, com o relato emocionado e desesperado de uma mãe que perdeu a guarda de
duas filhas pequenas após fugir do país do genitor das crianças. Raquel
Cantarelle é mãe de duas meninas, de 4 e 6 anos. Mesmo após comprovar que
sofria violência no país do então marido, as crianças foram enviadas pelo
estado brasileiro aos cuidados do pai, na Irlanda.
A DPU atua no caso perante
a Corte Interamericana de Direitos Humanos por violações do Estado Brasileiro
contra a mulher e suas filhas. Segundo Cantarelle, as crianças foram levadas
por policiais brasileiros, armados, numa cena de muitos gritos e choros das
crianças.
“Não podemos ignorar que,
no caso de mães e crianças em perigo, o retorno ao país de origem pode
significar a perpetuação de abusos e violação de direitos humanos. O meu apelo
é para que olhem para o meu caso e para tantos outros com atenção e empatia. Eu
peço que reconsiderem a forma como aplicamos essa convenção em nosso país,
garantindo que exceções, como a prevista no Artigo nº 13, sejam analisadas com
a devida seriedade e que cada decisão judicial seja uma decisão humana que
proteja quem mais precisa, que são as crianças”, pediu Cantarelle.
Luta da DPU
Em nota técnica, emitida
por meio do Grupo de Trabalho Mulheres da DPU, a instituição recomenda que, no
caso de uma acusação de sequestro internacional de crianças, as seguintes
medidas de salvaguarda sejam consideradas:
- Ocorrência de violência
doméstica a saber: violência física, violência psicológica, violência sexual,
violência patrimonial e violência moral,
- Examinar se, no país de
residência habitual, é crime a subtração internacional de crianças;
- Observar se há regras
que assegurem o status migratório seguro para a genitora para regressar ao país
de origem;
- Analisar se há garantia
de efetivo acesso à Justiça para a genitora, considerando especialmente os
custos envolvidos no processo judicial de guarda e acesso à assistência
judiciária gratuita, consultando qual seria a autoridade judicial competente;
- Determinar o retorno
acompanhado da mãe/genitor que for o principal cuidador da criança, evitando
rompimento bruscos;
- Se não for possível determinar
o retorno com a mãe, assegurar por parte do outro genitor que há anuência em
garantir o convívio com a mãe, estabelecendo cronograma de visitação até a
decisão da autoridade judicial local.
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