A candidatura imoral de Alcolumbre, por Lasier Martins


Vladimir Chaves

Além da série de votações urgentes para reagir aos desafios impostos pela terrível pandemia do novo coronavírus, o ano de 2020 no Senado Federal será marcado também pelos movimentos do seu presidente, Davi Alcolumbre (DEM-AP), para tentar continuar no cargo, mesmo sendo sua reeleição inconstitucional e largamente rechaçada pela maior parte dos brasileiros.

 

Encomenda de pareceres jurídicos favoráveis, negociações de bastidores nos Três Poderes e sondagens em torno de projetos para alterar a lei estão na agenda de investidas do chefe do Legislativo para manter-se no cargo. Tais gestos não contrariam só a liturgia esperada de quem comanda a mais alta Casa Parlamentar do país, mas também o recado das últimas eleições, por mudanças.

 

De cada quatro senadores que tentaram reeleição em 2018, três perderam, levando à maior taxa de renovação da história do Senado: 85%. Das 54 vagas em disputa, que equivalem a dois terços do plenário, 46 foram preenchidas por nomes novos, embora alguns vindos da Câmara Federal. Tivemos ainda a menor taxa de reeleição para a Casa da Federação vista em cinco eleições pós-redemocratização.

 

Foi nessa onda democrática que o Senado se renovou e chegou ao seu plenário um forte pedido do povo: é preciso alterar profundamente as práticas enraizadas e deploráveis de parlamentares que insistem em tratar a coisa pública como bem privado. Graças à cobrança popular por novos nomes e atitudes, formou-se o contexto que permitiu a eleição de Alcolumbre, na qual foi decisivo o voto mostrado às câmeras da imprensa.

 

Omissões, promessas quebradas e manobras adversas ao interesse geral para servir a grupos poderosos deixaram de ser toleradas desde então. Por essa razão, o ambiente que ensejou a consagração do presidente do Senado no início de 2019, por 42 votos, é o mesmo a condenar agora o uso do cargo para nele se perpetuar. Além disso, também fere o princípio da moralidade mudar as regras com o jogo em andamento.

 

A ideia de se barrar a reeleição para a Presidência do Senado no meio da Legislatura leva em conta o fato de o plenário ser refeito após a disputa por dois terços de suas cadeiras, ensejando nova composição. É, pois, o fim de um ciclo. Para completar os argumentos em desfavor da recondução de Alcolumbre para a Presidência da Casa está a expectativa de mudanças amplamente frustradas após sua eleição.

 

A adoção do voto aberto em deliberações do plenário (um dos ditames atuais por mais transparência e algo prometido pelo presidente logo em seu primeiro discurso), a negativa de análise pela Mesa do Senado das dezenas de pedidos de impeachment de ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) e a não apreciação do projeto que reestabelece a prisão em segunda instância no Brasil são algumas das tantas frustrações.

 

Foi com postura absolutista e discricionária que Alcolumbre conduziu e conduz a sua gestão de dois anos. Não houve sequer uma reunião da Mesa Diretora no ano passado, um absurdo se considerar que os 81 senadores formam um colegiado. Esse quadro foi ainda agravado pela situação de votações remotas devido à pandemia, com a impossibilidade do saudável e insubstituível debate presencial.

 

Alcolumbre manteve e ampliou o velho costume de presidentes do Senado de dominar por inteiro a pauta. Esse fato reforça a urgência de mudar o regimento interno da Casa para acabar de vez com esse poder demasiado e antidemocrático.

 

A História e as gerações julgam os seus personagens importantes não pelas palavras deles, mas pelos seus atos e pelas consequências dos seus feitos. É por essa mesma perspectiva que a população tem manifestado crescente insatisfação com a classe política do país. Os eleitores indicam mudanças com os seus votos, mas políticos resistem em mudar.

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